Chá, café...ou um copo de vinho tinto

 




Ouvi o silvo da chaleira ao lume, a água fervia, o chá ficaria pronto num instante…

Mas não tenho por costume fazer chá, nem oferecer chá às visitas, apesar de até acontecer ocasionalmente, o mais certo seria: Ploc! Com um movimento firme a rolha de cortiça é arrancada da garrafa libertando-se o agradável aroma do vinho tinto.

Contrariamente à minha vivência pessoal, reparei que nos livros que tenho lido é muito mais frequente as personagens oferecerem chá aos seus convidados. Talvez por ser mais sugestivamente sonoro o processo de preparar um chá. Além disso a palavra chaleira enche a boca, enche o espaço e as nossas memórias de infância. A recordação dos lanches em casa dos avós e das tardes de domingo em casa dos pais quando recebíamos visitas. Sim, há algo mágico e reconfortante em oferecer e preparar um chá, uma infusão quente e aromática. No entanto, estranhei quando, em vários livros, era essa a bebida que as personagens ofereciam às suas visitas, personagens jovens, dinâmicas, atuais. Não era um cafezinho, nem vinho, nem sequer um licor, e licor é uma palavra com uma sonoridade muito agradável…licor de framboesa, se tivesse, ofereceria sem pestanejar um licor de framboesa a quem me visitasse. Mas era chá que ofereciam. Punham a chaleira ao lume e continuava a narrativa enquanto a água atingia o ponto de ebulição. Após o silvo da chaleira que enchia todo o espaço e despertava o leitor e as personagens de novo para a ação, anunciando que a água estaria pronta, vertiam o líquido para uma chávena. Normalmente, depois de servido as personagens nem sequer tocam no chá, ficam ali, sentindo o calor nas mãos, com esperança que o fumegar liberte as conversas necessárias e não apenas o aroma da bebida. Talvez seja uma questão de compasso na narrativa: a oferta, o preparar, o esperar, o calor, o tempo, os sons e os cheiros, mas principalmente as palavras – chá, chaleira, chávena. Palavras intensas, com uma grande carga afetiva e histórica.

Por outro lado, nos écrans é muito frequente, talvez mais que na vida real, ver pessoas com um copo de vinho na mão. À tarde, ao fim do dia, até mesmo de manhã, sozinhas ou acompanhadas. O copo de vinho é elegante, é colorido, é apelativo e sensual e transmite segurança, tranquilidade, poder, confiança. Uma personagem sozinha, ele ou ela, com um copo de vinho na mão, é sempre alguém com classe, com o domínio da situação, por muito miserável e solitária que a sua “vida” seja. O mesmo não se pode dizer se o vinho for bebido diretamente pela garrafa, então é porque está a bater no fundo. Se eu abrisse uma garrafa de vinho tinto com a mesma frequência que se vê nos filmes alguém a beber vinho fora das refeições, iria triplicar o seu consumo. Não é que não aconteça, acontece com muito mais frequência do que as vezes que bebo chá.

Uma ótima opção será oferecer um café, um robusto e aromático café numa elegante chávena de vidro. Também tem o seu processo de preparação sonoramente apelativo, tem cor, tem um aroma forte e personalidade.



Foto de passagem do livro Águas passadas de João Tordo 

Chá, café...ou um copo de vinho tinto

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