A noite estava escura, sem luar.
Atrevi-me a sair da proteção da tenda, calcei as botas às apalpadelas e dei um
passo. A escuridão era total. Não tinha lanterna nem fogo nem nenhum ponto de
luz. Também não sabia bem para onde me dirigir. Queria encontrar os meus
companheiros mas, sozinha na noite, temia perder-me. Tentei encontrar algumas
referências e decidir qual a direção a seguir porém, olhando em volta nada via,
nem luz nem movimento. O terreno era ligeiramente inclinado e lembrei-me que
tínhamos decidido montar as tendas na zona mais baixa do declive. Seria para
cima o caminho. Dei uns passos a medo. Completamente sozinha na floresta e na
escuridão total, avançava lentamente. Tinha percorrido alguns metros quando uma
onda de pavor me percorreu. E se não os encontrasse? Já não conseguia voltar
para trás. Tinha-me afastado bastante da tenda e, entre as árvores e vegetação,
já não a conseguia ver. Sem luz nunca a encontraria de volta e não valeria a
pena tentar fazer o percurso contrário, tinha noção que o mesmo não fora linear.
Perante tal cenário tive de fazer um esforço para que o pânico não me
dominasse, não me paralisasse. Tinha de sair dali, havia de ganhar coragem e
avançar. A medo dei mais uns passos. A cada passo os sons da floresta pareciam
ganhar vida. Rodeada de trevas, com o sentido da visão completamente anulado e
a audição ganhando intensidade, deparei-me no meio de uma orquestra de sons
estranhos e desconhecidos. Ouvia movimentos, rastejar, estalidos, piares, o som
das árvores, das folhas, dos ramos, sons da brisa, sons de um mundo novo e
desconhecido, tão cheio de vida, quando pensamos que apenas existe silêncio.
Mais um estalar, movimento, folhas e ramos remexidos, partidos...passos! Paro.
Pára o som também…são os meus passos! Respiro fundo e ganho coragem de retomar
o caminho. Mais uns passos e a cada passo novos ruídos, novos medos. Não sei bem
para onde vou mas continuo a andar, devagar. Paro de novo e percorro com o
olhar a floresta à minha volta. Nada. Nem luz nem o som de vozes. Estou
completamente só. Continuo o percurso que tenho esperança me leve aos meus
amigos. Avanço mais um pouco na floresta, com passos curtos e inseguros, não
vejo o chão, não sei o que piso, apenas oiço os gemidos dos galhos partidos, das
folhas pisadas, dos ramos abanados à minha passagem. Ali! Uma luz, vejo uma
luz, um clarão ainda difuso mas visível! Apresso o passo. O coração dispara. À
medida que avanço, agora mais rapidamente, torna-se nítida a fogueira, a luz das
chamas mais intensa, dominando a noite, oiço vozes. Os sons noturnos da
floresta são agora completamente abafados pela melodia de uma guitarra,
habilmente dedilhada, por vozes alegres, conversando e cantando. Corro naquela
direção e alcanço o grupo animadamente reunido ao redor da fogueira. “Sempre
vieste” dizem. Aceno afirmativamente, meio envergonhada. Sento-me e deixo-me
envolver pelo calor e reconforto da luz e do fogo. Mais tranquila relaxo e
tento esquecer aquele percurso. Começo a conversar e a cantar. Deixo que a paz
e a alegria sejam os sentimentos que dominarão o que resta da noite. À volta da
fogueira, enquanto conseguirmos fintar o sono, rimos, cantamos, conversamos,
criamos e fortalecemos laços de companheirismo e amizade que nos ajudarão a
crescer. Sinto-me verdadeiramente feliz e orgulhosa e assim me sentirei durante
todo o acampamento, durante todos os acampamentos e atividades.
Apesar do esforço nunca mais
consegui esquecer aquela primeira noite do meu primeiro acampamento como
escuteira, teria eu uns 11 ou 12 anos. Por muito difíceis que tenham sido, há
momentos que devemos sempre recordar porque foram passos importantes que demos
no percurso da nossa vida. Momentos superados que nos fizeram crescer e
aprender. Eu aprendi que nunca se vai para o campo sem uma lanterna!
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