Tribunal




Pronto, aconteceu! Algum dia teria de ser. Já tinha recebido algumas notificações para comparecer em tribunal para ser ouvida, na qualidade de testemunha, em audiência de julgamento. No entanto, por os processos terem sido suspensos, arquivados ou porque as partes chegaram a acordo, nunca tinha chegado a entrar numa sala de audiência, num julgamento.

Cheguei cedo, fui, aliás, a primeira a chegar, quinze minutos antes da hora referida na notificação. Quando entrei no edifício do tribunal atravessei o átrio e dirigi-me a um segurança a quem mostrei a notificação e perguntei onde me dirigir. Indicou-se uma zona de espera para onde segui de imediato, sem passar pelo detetor de metais – 1ª desilusão. Imaginava a agitação e animação matinal ao passar pelo detetor de metais, com o relógio, cinto, pulseira, brincos e principalmente a carteira cheia de tralha, fazendo a máquina apitar.

Sentei-me sozinha num banco corrido e observei o espaço. O tribunal está instalado num edifício renascentista, que se desenvolve à volta de um magnífico claustro. Nas galerias inferiores do claustro, de cobertura abobadada, situam-se as salas de audiência. Apesar das sucessivas transformações e adaptações que o edifício sofreu, o claustro mantém as suas caraterísticas quinhentistas, tendo sido elemento fundamental, não só na conceção do edifício, como na sua adaptação ao uso atual. Chegada a hora marcada e já com a presença dos demais intervenientes, foi feita a chamada e fomos encaminhados para a zona de entrada da sala de audiências onde decorreria o julgamento. Eu seria a quinta testemunha a ser inquirida.

Sentei-me com as outras testemunhas num banco corrido, na galeria, à porta da sala de audiência, de frente para o jardim do claustro. Até aí tudo normal, pelo que me recordo dos filmes e séries, também aí as testemunhas esperam no corredor, à porta da sala, sentadas em bancos corridos de madeira. Tendo sido previamente avisada da demora que poderia ocorrer até ser ouvida, ou eventualmente dispensada, levei uma revista para ler e manter-se entretida, conseguindo também assim evitar manter conversa com outra das testemunhas com quem a relação não anda nos melhores dias. As várias testemunhas foram sucessivamente chamadas pelo simpático oficial de justiça e as páginas folheadas e lidas da revista aproximaram-se do fim. Até estava a correr bem, estava a ser relativamente rápido…tão rápido como num consultório médico.

Quando a quarta testemunha a ser inquirida saiu, o oficial de justiça fez-me sinal para entrar, tendo obedecido prontamente. É agora! Entrei na sala de audiência um pouco nervosa e coloquei-me, de pé, onde me indicaram – 2ª desilusão. A sala era minúscula, com um sistema de som que não funcionava (bem), com vários estrados onde se colocam elevadas as cadeiras do Juiz, dos procuradores e dos advogados. Num nível inferior estava o oficial de justiça, a testemunha (eu) e uma pessoa a assistir. Contrariamente aos filmes e séries de televisão, a testemunha está de frente para o juiz e de lado para os advogados. Não consegui perceber qual o local do arguido… também não havia assistência nem jurados, nem tão pouco um Dr. Bull, mas valeu-me a sorte do juiz ser bastante bem-parecido.

O que se passou a seguir não teve interesse nenhum, com exceção do facto do meu nome não estar corretamente referido, isto ainda na parte em que o juiz me dirigiu a palavra. De resto ou as perguntas da procuradora ou as minhas respostas foram tão desprovidas de interesse que nem os advogados de defesa me quiseram inquirir. Resumindo, a minha primeira experiência em tribunal ficou-se por cerca de quinze minutos dentro da sala de audiência, maioritariamente preenchidos a encontrar papelada no processo e tendo obrigado a Sr.ª procuradora a descer por duas ou três vezes do seu pedestal para me indicar a quais documentos se estava a referir, já que a numeração indicada por ela não correspondia aos documentos com os quais pretendia argumentar e inquirir-me. Devo confessar que, para além da simpatia e figura do juiz, o que mais apreciei na minha audiência foi ter feito a procuradora levantar-se da sua cadeira por várias vezes para descer ao meu nível, mas a espectativa de viver acontecimentos únicos e emocionantes dentro da sala de audiência de julgamento saiu gorada.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Chá, café...ou um copo de vinho tinto

  Ouvi o silvo da chaleira ao lume, a água fervia, o chá ficaria pronto num instante… Mas não tenho por costume fazer chá, nem oferecer ch...