A mala


O telemóvel toca, toca, mas não o consigo encontrar. Oiço o som, sinto o vibrar, mas não o encontro, embrenhado entre as tralhas que tenho na mala. Calou-se. Encontrei-o. É incrível o peso e a quantidade de coisas, uteis, que tenho na mala. Para os mais distraídos será apenas uma mala, pesada, mas a verdade é que é uma autêntica ferramenta multifunções, maior que um canivete suíço, ok, mas com muitas mais funções e utilidades. Vejamos: enquanto a manuseio e transporto exercito os músculos sem cair no ridículo de andar pela rua com um haltere; numa eventualidade de ser atacada, assaltada ou simplesmente tiver de usar da força e de alguma violência, tenho-a como arma de arremesso, porá o meu opositor se não inconsciente, pelo menos atordoado o suficiente para que me possa pôr a salvo; dentro da mala existe uma infinidade de coisas e objetos que, como mulher prevenida que sou, em alguma altura da minha existência, me serão muito úteis. A minha mala é muito mais recheada e surpreendente do que a mala do Sport Billy!
Houve uma altura da minha vida em que não precisava de mala, todos os objetos de que necessitava eram distribuídos pelos bolsos das calças e do blusão. Mas depois cresci, tornei-me uma mulher responsável e com responsabilidades, com marido e filhos… e todos sabemos que nas malas das senhoras também se guardam objetos úteis aos filhos, marido, namorado ou afim. Como é que um homem consegue sair de casa descontraidamente apenas em calções e t-shirt?! Porque sabe que na mala de alguém haverá lugar para as chaves de casa, para as chaves do carro, para a sua própria carteira, que não cabe nos bolsos dos calções, para o seu telemóvel e óculos de sol quando ficar de noite ou se tornarem dispensáveis…Porque sabe que se precisar, naquela mala haverá certamente um comprimido, mesmo que perdido e fora de prazo, para as dores de cabeça, naquela mala há, com toda a certeza, um ou vários pacotes de lenços de papel, uma caneta e um papel, que poderá bem ser de uma fatura ou conta por pagar, onde apontar qualquer informação pertinente e até uma pequena fita métrica para tirar medidas, porque nunca se sabe onde o destino nos leva e, vai-se a ver, dava mesmo jeito esta estante lá em casa ou aquela rede mosquiteira para as janelas, se tiver as dimensões desejadas.
No entanto a minha mala é neste momento uma sombra do que já foi, nos seus tempos áureos, quando os meus filhos eram pequenos, os objetos que albergava eram muitos mais e mais surpreendentes. O peso que deixam de transportar na barriga as jovens mães passam a transportar ao ombro, dentro da mala. Desde chuchas a brinquedos e pequenos livros com figurinhas, passando a toalhetes, fraldas de pano e descartáveis, babetes, supositórios, bolachas, água, até aos documentos, livro de vacinas e boletim médico, encontra-se sempre um objeto inusitado na mala de uma jovem mãe.
Admito que transporto muitos objetos que poderia dispensar considerando as tecnologias disponíveis mas, por preguiça, ainda não instalei no telemóvel o programa que me permite não andar com todos os cartões de supermercados, livrarias, lojas de brinquedos, que já deixei de usar, lojas de roupa, lojas de desporto, sapatarias, perfumarias, etc. Sei que disponho dessas funções todas no telefone mas, como pessoa do século passado que sou, ainda estou muito apegada à minha agenda em papel, que todos os anos recebo da UNICEF, e ao livrinho de endereços, daqueles com nomes de rua e números de porta para enviar cartas e postais a sério.
Seja como for, como é que eu poderia ter sempre acessível um saco de pano que se dobra sucessivamente até um tamanho incrivelmente pequeno e dá um jeitão quando temos de fazer uma compra de última hora, que é todos os dias, o creme de mãos, o batom hidratante, o corta unhas, um pequeno espelho, toalhetes refrescantes, os já referidos lenços de papel, produtos de higiene feminina que inesperadamente podem ser necessários e não convém nada sermos apanhadas desprevenidas, um livro de apontamentos, recordação que a minha querida irmã me trouxe de Itália, porque a qualquer momento posso ter um surto de inspiração, se não fosse na mala?

Mas de todos os objetos que se podem encontrar dentro da mala, talvez o mais inútil seja o pequeno cabide, para malas, daqueles que se encaixam numa mesa, de restaurante, por exemplo, permitindo deixar a dita cuja pendurada e evitando o tão desagradável e anti-higiénico colocar da mala no chão…inútil porque o pequeno cabide não aguenta o peso excessivo…

1 comentário:

  1. Um mundo dentro de uma carteira, que mais parece umas mala de viagem! ��
    Uma verdadeira viagem ao mundo secreto das mulheres e à suas várias etapas de vida.
    Mais uma crónica para ler e esperar por mais! ��

    ResponderEliminar

Chá, café...ou um copo de vinho tinto

  Ouvi o silvo da chaleira ao lume, a água fervia, o chá ficaria pronto num instante… Mas não tenho por costume fazer chá, nem oferecer ch...